domingo, 15 de março de 2015

O MARIDO  DE  ERIN  GRUWELL


Muitas de nós suspiramos, ao ver Patrick Dempsey encarnando o marido Scott Casey, bonitão, educado e fino, de Erin Gruwell.

A definição atual para um relacionamento que acabe numa separação é a frase: Foi bom enquanto durou.

Bom, o quê? Enquanto durou não esteve tão bom assim. Seriam os momentos de intimidade? Só se for. Mas sexo não é um casamento inteiro. Nós mulheres gostamos e precisamos ser elogiadas, valorizadas, olhadas, tocadas, incentivadas, estimuladas e amadas.

Prestem atenção na falta de companheirismo de Scott, nos questionamentos. Se estava satisfeita? Se compensava trabalhar tanto? Como uma professora tinha que trabalhar em outro turno para "pagar" pelo seu trabalho de professora (para comprar livros para os alunos)?

Erin Gruwell teve muita paciência. Trabalhava, chegava em casa e ainda cozinhava algo especial. O marido conversava com ela, mas não tinha interesse, não valorizava o que ela dizia. 

Era o terceiro ou quarto turno dela. Trabalhava na escola, na loja de lingerie, no final de semana no hotel, cozinhava, lavava, passava, arrumava a casa e ainda planejava aulas contagiantes.

Que dia o marido ajudou Gruwell nos afazeres domésticos? Que dia pagou uma faxineira, para achar que tinha o direito de falar e reclamar daquele jeito?

Quando o marido chegou com algo especial para Gruwell, a não ser as críticas? Quando apoiou sua profissão? Por que não entendeu que os diversos empregos de Gruwell eram temporários? Esses outros empregos seriam temporários até ela conseguir verba e patrocínio para outros projetos, como aconteceu mais tarde.

Ele não queria atuar como arquiteto. Ela tentava motivá-lo, mas respeitava sua decisão de não atuar como arquiteto. Não ficou jogando na cara, respeitou a sua escolha e ele não respeitou a dela. Sentiu-se como "colocado de lado". E não foi bem isso. Erin estava começando no emprego, iniciando uma nova carreira. Por que o marido não a motivava, por que só vinha com críticas "educadas"?

A resposta é que o marido não participava de um projeto de vida com Gruwell. Ele queria aquela esposa ali, submissa, disponível pra cama e pra casa. Ele queria a sua posse. Que ela pensasse como ele e acatasse o que ele dizia. Em nenhum momento o marido levou em conta a satisfação pessoal de Gruwell, que o dia-a-dia com os alunos na escola a fazia feliz, a realizava.

Disse no momento da separação que o que ela fazia era lindo, muito nobre, mas que não dava mais. Não dava mais pra ele ver o sucesso profissional da mulher. Sempre tendo elogios e retribuições dos alunos. Não dava pra ele ver mais as matérias nos jornais, destacando as práticas inovadoras de Gruwell. Não dava mais porque ele se mantinha acomodado numa carreira, enquanto a esposa enfrentava os desafios de frente e superava  todos. 

Não, não dava mais pra conviver com uma mulher dessa, que falava de seus alunos como amigos. Que contava com tanta alegria os avanços que os alunos obtinham. Ele queria de volta a "mulherzinha" dele, que tivesse olhos voltados somente para ele. Que fizesse somente o que ele quisesse, falasse somente de coisas que ele tinha interesse. Que fosse dessas bem fúteis, que a gente é obrigada a conviver. Que só falasse de casa, de comida, do próprio marido, de roupas e programas de auditório e séries de TV.

Gruwell pensava e como ser pensante, encontrou numa profissão de grande valor pra sociedade (embora a grande maioria só se dá conta disso, depois de adulto), o entusiasmo, a motivação, a retribuição nos olhares e vozes de cada um daqueles alunos. E isso era muito gratificante para ela. E por que não podia ser?

Ela cresceu. Tinha um projeto de vida, de profissão, um carreira. O que ele queria? Alguém que simplesmente o acompanhasse.

Chega em casa, arruma as malas e diz:
__ Querida, é muito nobre o que você faz, mas estou fora. 

Nos últimos meses, pesquisadores descobriram o que dificulta a carreira das mulheres. E não são os filhos, são eles, os maridos.

Quando os filhos chegam e as tarefas domésticas aumentam, a maioria dos homens não querem compartilhar e dividir as tarefas igualmente. Muitas têm que optar pelo sucesso da carreira do marido em detrimento da sua (mudar de cidade porque o marido foi transferido e/ou resolve se transferir). Não conseguem conciliar tarefas domésticas (que não são divididas) com cursos e práticas de aperfeiçoamento (cursos e a boa leitura de atualização de todo dia) etc. Ficam sobrecarregadas, estagnam na carreira, outras optam por ficar em casa somente para cuidar dos filhos e dos afazeres domésticos. Existem aquelas que os maridos não deixam trabalhar fora, etc.

Existe uma série de situações onde a mulher tem que colocar sua carreira de lado, se sobrecarregar de tarefas com os cuidados dos filhos e da casa, enquanto o homem chega do emprego, descansa, vê televisão, vai pro bar, etc. No final de semana somente descansa, enquanto a mulher é a mãe, faxineira, cozinheira, lavadeira e à noite tem que ser a "esposa"... 

E ainda tem que manter o humor, dizer e pensar que isso tudo é a obrigação da mulher. Segundo nossa tradição patriarcal a função da mulher é cuidar da casa e dos filhos. A função tradicional dos homens é ser o provedor, o protetor do lar.

Mas os tempos mudaram, a economia mudou, as necessidades de uma casa e dos filhos mudaram. Hoje é muito difícil que um homem consiga manter, economicamente falando, uma casa, a mulher e os filhos com suas reais necessidades alimentares, de moradia, vestuários, educacionais, de saúde e lazer. Só se for rico, porque até a classe média alta, necessita da complementação de renda do trabalho da mulher.

Pois bem, os homens pobres, de classe média e média alta adoraram a ajuda da mulher no orçamento familiar. As mulheres aceitaram dividir as despesas com os homens e estes, em sua grande maioria, ainda não aceitaram a divisão das tarefas domésticas e de cuidados com os filhos. E as mulheres, na sua grande maioria, ficam sobrecarregadas de tarefas, que geram noites mal dormidas, insônia, stress, depressão e vários outros problemas de saúde, que vão chegando lentamente ou não. É o machismo de nossa sociedade que sufoca a mulher e promete a ela esse ideal de "felicidade".

Uma coisa tem que se elogiar no marido de Gruwell, ele pegou seu egoísmo, seu machismo e se retirou de cena. Não insistiu em desconstruí-la (a maioria faz isso), não a explorou economicamente e  não a traiu, Ele simplesmente saiu da sua vida.


Sandra Cristina Gomes - professora de História e Geografia, graduanda em Pedagogia pela Universidade Federal de Juiz de Fora.
Email: sandracgh.gomes@gmail.com

4 comentários:

  1. Eu concordo,mas acho essa visão feminista demais ,não é pq é homem que não merece carinho e atenção ,sim concordo ela teve paciência ,mas devemos ver o lado dele também ,não acho que ele queria uma mulherzinha submissa,acho que ele queria que ela conseguisse conciliar a carreira com a vida pessoal,não estávamos la entre o casal para julgar os motivos de ambos.

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  2. Mas a visão precisa ser feminista "demais".
    Em momento nenhum o artigo acima diz que homem não merece carinho.
    A forma que o filme nos apresenta Scott deixa algo claro: o problema não é que ela não conseguia conciliar a carreira mas o verdadeiro problema é que ela estava voando longe, sendo reconhecida e tento muito sucesso na carreira enquanto ele nao tinha coragem de ir atrás dos seus sonhos e ser arquiteto.
    Tanto que em um dos últimos diálogos antes deles se separarem ela pede que ele a apoie e fique feliz com o seu sucesso do mesmo modo que uma esposa ficaria feliz pelo sucesso do marido e ele diz que não consegue ser "esposa dela"
    Não sei se dá para entender bem mas para mim uma coisa é clara: as mulheres desde sempre são obrigadas a ficar em que casa e ver o sucesso do marido e conseguem ficar felizes por eles mas os homens ( Não todos, não quero generalizar) não conseguem fazer o mesmo.
    Mesmo que de uma forma mais branda o Scott é machista sim e não precisamos estar lá entre o casal para notar isto.

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  3. A pergunta é essa você fica falando do que o marido dela e para você e nao para o filme

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  4. Estou aqui comentando para agraciar esse texto que simplesmente organizou tudo que se passou na minha mente depois que assisti esse filme. Mesmo já tendo visto cenas, eu nunca tinha assistido completo até hoje.
    Sempre achei esse cara um babaca.
    Pelo menos uma coisa positiva sobre ele, ao final do seu texto, eu pude perceber. Realmente, ela está melhor sem ele.
    Agradeço pelo texto!

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